É MESMO?
Não é interessante
que alguém goste de poesia
e de luta ao mesmo tempo?
Não é contraditório
que alguém acredite em Deus
e, por vezes, se desespere?
Não é meio ridículo
pesar mais de cem quilos
e não se enxergar gordo?
Não parece bem bobo
conhecer os dramas do mundo
e fazer piada de alguns deles?
Não é exagerado
derramar umas tantas lágrimas
porque o filho dormiu no seu colo?
Não é patético
amar muito, muito mesmo
e brigar por tão pouco?
Não soa meio dramático
tanto querer, tanto desejo, tanto me dá,
duas décadas depois da adolescência?
Não é muito irônico
que a substância, que é só por ser,
sofra as qualificações de quem a vê?
TABACARIA
Fernando Pessoa
Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do
Mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que
ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada
constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa,
desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos
seres,
Com a morte a pôr umidade nas paredes e cabelos
brancos nos homens,
Com o destino a conduzir a carroça de tudo pela
estrada do nada.
Estou hoje vencido como se soubesse a verdade.
(...)
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